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Lesoto. “Não me esqueça”: o apelo de um país

Carmelo de Grazia

Lesoto. "Não me esqueça": o apelo de um país

O reino do Lesoto é um país encravado na África do Sul. E, para dizer a verdade, não o pisei, até porque ali se encontra o aeroporto mais perigoso do mundo, com uma pista curta de 400 metros, terminando num penhasco. Creio que o sobrevoei quando fui para a África do Sul, tendo como destino o Shongololo Express. Acontece, porém, que nessa viagem de comboio conheci um casal de médicos ingleses que trabalharam na organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), no Lesoto. Num dos dias, pudemos conversar para me aperceber melhor do flagelo que foi a quantidade de pessoas portadoras do Vírus da Imunodeficiência Humana, incluindo mulheres grávidas. Esta situação levou o Governo a oferecer testes gratuitos para toda a população. O casal trabalhou nas equipas que, nos primeiros anos deste século, trabalharam para conter o problema, atuando medicamente e esclarecendo a população. Num pequeno país de 30.000 quilómetros quadrados, vivem dois milhões e duzentas mil pessoas. A MSF concentrou-se, principalmente, na oferta de cuidados de saúde gratuitos para mulheres, bem como no planeamento familiar e no tratamento da sida e da tuberculose, principais fatores que provocam a alta mortalidade materna. Aqueles médicos estiveram no hospital distrital de St. Joseph, onde a MSF cobriu todas as despesas de cuidados de pré-natal e dos partos. Após quase uma década de trabalho no Lesoto, a MSF entregou os seus projetos ao Governo, em novembro de 2015, depois de os mesmos terem conseguido amenizar as barreiras no acesso aos cuidados de saúde. Nas áreas urbanas, cerca de 50% das mulheres com menos de 40 anos estão infetadas com o vírus. O Governo considera este flagelo como uma das suas questões de desenvolvimento mais importantes e abordou a pandemia por meio de seu Plano Estratégico Nacional de HIV/AIDS. Bill Clinton e Bill Gates interessaram-se pelo problema, visitando o país, tal como o príncipe Harry, atual Duque de Sussex do Reino Unido, que cofundou uma instituição de caridade para crianças infetadas, tendo como parceiro o príncipe Seeiso, o irmão mais novo do rei Letsie III do Lesoto. A instituição intitula-se “Sentebale”, que significa “Não me esqueça” em sesoto, a língua nativa. “Foi um raio de esperança”, disse-me o médico, que também referiu a importância do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) ao assumir a responsabilidade de financiar a oferta de cuidados maternos gratuitos no hospital de St. Joseph, sendo que a MSF continuaria a defender a implementação universal do atendimento de saúde materna gratuito no país. Naquela viagem de comboio, chegara o tempo da refeição e concluímos a nossa conversa, sem que antes aquele casal me lembrasse de que, apesar de este problema de saúde estar a ser gradualmente resolvido para índices mais esperançosos, muito mais há a melhorar no território. “Imagine que o transporte mais comum de pessoas e cargas é o pónei”, disse o médico. “Temos um carinho especial pelas crianças e mães, vítimas de um tempo matreiro. Sentimos que o Governo está a fazer tudo o que pode.” E lembrou: “Sabe?, Nelson Mandela disse em tempos que lidar com este grande problema requer recursos muito para além da capacidade de um país ou de um continente. É mesmo isso que os povos necessitam e que o mundo espera.” E também em todo o tipo de doenças, digo eu, nomeadamente nas que levam aos conflitos bélicos.

Carmelo De Grazia

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Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN

O reino do Lesoto é um país encravado na África do Sul. E, para dizer a verdade, não o pisei, até porque ali se encontra o aeroporto mais perigoso do mundo, com uma pista curta de 400 metros, terminando num penhasco. Creio que o sobrevoei quando fui para a África do Sul, tendo como destino o Shongololo Express. Acontece, porém, que nessa viagem de comboio conheci um casal de médicos ingleses que trabalharam na organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), no Lesoto. Num dos dias, pudemos conversar para me aperceber melhor do flagelo que foi a quantidade de pessoas portadoras do Vírus da Imunodeficiência Humana, incluindo mulheres grávidas. Esta situação levou o Governo a oferecer testes gratuitos para toda a população. O casal trabalhou nas equipas que, nos primeiros anos deste século, trabalharam para conter o problema, atuando medicamente e esclarecendo a população. Num pequeno país de 30.000 quilómetros quadrados, vivem dois milhões e duzentas mil pessoas. A MSF concentrou-se, principalmente, na oferta de cuidados de saúde gratuitos para mulheres, bem como no planeamento familiar e no tratamento da sida e da tuberculose, principais fatores que provocam a alta mortalidade materna. Aqueles médicos estiveram no hospital distrital de St. Joseph, onde a MSF cobriu todas as despesas de cuidados de pré-natal e dos partos. Após quase uma década de trabalho no Lesoto, a MSF entregou os seus projetos ao Governo, em novembro de 2015, depois de os mesmos terem conseguido amenizar as barreiras no acesso aos cuidados de saúde. Nas áreas urbanas, cerca de 50% das mulheres com menos de 40 anos estão infetadas com o vírus. O Governo considera este flagelo como uma das suas questões de desenvolvimento mais importantes e abordou a pandemia por meio de seu Plano Estratégico Nacional de HIV/AIDS. Bill Clinton e Bill Gates interessaram-se pelo problema, visitando o país, tal como o príncipe Harry, atual Duque de Sussex do Reino Unido, que cofundou uma instituição de caridade para crianças infetadas, tendo como parceiro o príncipe Seeiso, o irmão mais novo do rei Letsie III do Lesoto. A instituição intitula-se “Sentebale”, que significa “Não me esqueça” em sesoto, a língua nativa. “Foi um raio de esperança”, disse-me o médico, que também referiu a importância do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) ao assumir a responsabilidade de financiar a oferta de cuidados maternos gratuitos no hospital de St. Joseph, sendo que a MSF continuaria a defender a implementação universal do atendimento de saúde materna gratuito no país. Naquela viagem de comboio, chegara o tempo da refeição e concluímos a nossa conversa, sem que antes aquele casal me lembrasse de que, apesar de este problema de saúde estar a ser gradualmente resolvido para índices mais esperançosos, muito mais há a melhorar no território. “Imagine que o transporte mais comum de pessoas e cargas é o pónei”, disse o médico. “Temos um carinho especial pelas crianças e mães, vítimas de um tempo matreiro. Sentimos que o Governo está a fazer tudo o que pode.” E lembrou: “Sabe?, Nelson Mandela disse em tempos que lidar com este grande problema requer recursos muito para além da capacidade de um país ou de um continente. É mesmo isso que os povos necessitam e que o mundo espera.” E também em todo o tipo de doenças, digo eu, nomeadamente nas que levam aos conflitos bélicos.

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Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.

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